quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Ao amor!

Amor não é aquela coisa louca, desesperada.
Talvez paixão seja isso, como já diria vovó Rita Lee.

Amor é aquela coisa gostosinha, um humanismo extraordinário que nos faz tentar ser melhor. Amor é um passeio de mão dada. Um dia de frio, encolhidinhos, escutando o barulho da chuva. Leitura a dois no parque. Um beijo estalado. Um abraço quando você mais precisa. Amor é tanta coisa. E ao mesmo tempo não é nada, se você não se doar. Amor é um clichê.
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Todo esse amor é para falar do dia 24 de dezembro, véspera de Natal. Foi um dia especial. Não pelo mito da religião. Mas porque a Gaby fez seus dois meses. E o meu irmão noivou. Foi bonito, só nossa família. Acolhedor. E todo mundo chorou. O melhor presente, entre tantos.

No mesmo dia, minha amiga Bia ganhou uma bela aliança também.
Esse é o espírito de Natal. A partilha, a crença.
E tem também a Sheila e o Rodolfo. Instantâneo e fatal. Trocaram alianças um pouco antes desse 24 de dezembro e estão em eterna lua de mel.

Hearts, do Jim Dine, Kiss, do Roy Lichtensterin e as palavras do Veríssimo concluem meu pensamento.
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Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amores impossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. O romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance. Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar. Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando, porque embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

Falando em 2007...

O ano foi um meio termo incrível.
Nunca vivi tão intensa e loucamente como em 2007.

Lá no comecinho larguei o emprego que amava, uma leve questão de stress. E o teatro, minha paixão da vida toda. Nenhum dos dois foi uma perda memorável, mas tudo seria bem diferente - e como seria! Em meados de maio comemorei um ano de ex-noivado, e ali, juntinho, dei tchauzinho a um cara que definitivamente não merecia minha companhia.

Vendi o pequeno Haroldo Jr, meu celta de estimação. Ah, quanta adrenalina! Certamente a maior saudade desse ano. Valeu a pena, ano que vem tem apê na área!

A parte boa do primeiro semestre, talvez a única, foi retomar a grande amizade com a Sabrina Magalhães, uma louca que conheci lá na UTP, nos primeiros anos de Publicidade, uns sete anos atrás. De capiau do Rio Grande do Sul ela virou uma estrela, lá da G/Pac. E Deus abençoe a América!

No final do primeiro tempo completei meus 23 anos. No mesmo dia que tia Dercy Gonçalves fez os seus 100. Fica a dúvida se a loucura vem pelo dia ou pelo excesso de coca-cola.

A segunda metade do ano foi fenomenal.

Em julho comecei o curso de jornalismo, lá na UniBrasil. Confesso que a publicidade é uma paixão, mas jornalismo virou aquele amor, que você faz juras eternas e assina a comunhão total de bens. A parte engraçada é que sempre me falaram vai lá, faz jornalismo, você gosta de escrever. E sempre neguei. Idiota. Tomei né.

No curso conheci alguns entusiastas. Amizades tão boas. Entrei para o Midiabólicos, a convite do Victor, que me trouxe outra visão do jornalismo. Fiz uma porção de exemplares do Capital, junto com o Rafael e algumas canecas de café. Briguei, algumas vezes, pelo meu jeitinho literário de ser. Mas valeu, tudo valeu.

Entrei para a turma da caverna. Conheci o Loyola Brandão, Tony Bellotto e o Arnaldo Antunes, pelo Midiabólicos. Fui numa corrida de turfe. Usei All Star e uma camisa do Chapolin pela primeira e única vez na vida. Vi o Chico de pertinho. Fiz minha inscrição na pós - comunicação, cultura e arte. Comecei alguns empreendimentos e conclui algumas loucurinhas. Deleites.

E o mais importante, ganhei uma afilhada linda e esperta, chamada Gabrielly, filhota do meu irmão super apressado. E ela tem o meu nariz empinado e minha boca pequena. Aiai. Minha mãe fez seus 50 anos e pirou de vez! Uma Rita Lee dos avesos. E meu pai foi pra mesa cirúrgica. Foi e voltou, uns 10kg mais magro e bonito. Aprendeu que com saúde não se brinca. O Ro, meu melhor amigo e confidente, foi para a Espanha e me deixou com saudade. Minha irmã completou 8 meses de namoro e entrou para a faculdade. Tudo que eu fiz de errado, ela vai fazer de Direito.
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O Natal foi bom. Lá na chácara. Meus pais, irmãos, cunhados e a pequena Gaby, que competiu com a tia Fran o papel de mamãe noel.
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E essa ultiminha semana me é inspiração para escrever, depois de todo um turbilhão emocional. A primeira imagem é do John Clem Clarke e depois vem a do Kosovsky, chamada Fluo Flowers, todos pop art, a inspiração para o próximo ano.

Como diria uma dupla, um Brian 2008 para você!

Mundo, voltei!

O mundo estava meio borococho. Mas agora acabou!

Entrei numa fase pop art, um rebelião interna, igual ao movimento. Claro que Andy Warhol, Roy Lichtenstein e Robert Rauschenberg eram uns caras bem mais certos do que eu - ou não. Enfim, o importante é que vejo o mundo com outros olhos. Uma forma bem mais leve e divertida de ser.

Meio óbvio que não vou criticar a sociedade por causa do consumismo. Seria como transformar quatro anos de faculdade numa música funk. Vou fazer da palavra minha tinta acrílica e falar do mundo. Delicioso hem!

A imagem é do Tom Slaughter e chama New York City.

E chega de papo morno!

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

cícero disse...

Nunca estou mais acompanhado do que quando estou sozinho.

orison swett marden disse...

As coisas não mudam, nós é que mudamos. O início de um hábito é como um fio invisível, mas cada vez que o repetimos o ato reforça o fio, acrescenta-lhe outro filamento, até que se torna um enorme cabo e nos prende de forma irremediável, no pensamento e ação.

clarice lispector disse...

Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

cristovão tezza disse...

Acho que a internet está exigindo que as pessoas
tenham de escrever cada vez melhor.
Elas têm de praticar.
A escrita voltou a ser um valor social.
E quando isso acontece, todas as forças começam
a trabalhar nessa direção.

Qualquer estrela

Vou convocar todas as estrelas,
das mais belas às vagabundas,
todas com seu brilho
rico, tênue ou vulgar,
o céu mais azul,
de azul dolorido
em meio a parabólicas.
satélites, dores
e a gordura da lua

A lua barriguda
tecida num pasto vivo,
vivo de ardume, cardume e alma
pleno de estrelas vadias
o cintilar arrumado
em um cinto que rodeia
desordenado
o teu corpo

Nilson Monteiro, jornalista.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Do Pequeno Príncipe...

A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo já pronto nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!

clarice lispector disse...

Cortar os próprios defeitos pode ser perigoso.
Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta o edifício inteiro.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Um suspiro.

Tenho tanto para escrever. Acho que não vou escrever nada. Estou cansada, exausta.
O que me preocupa, disso tudo, é que não estou tendo tempo para mim. Tempo sempre foi uma coisa tão importante, algo muito maior que a vida, que o ser. Um desabafo em meio ao tumulto. Solidão, pura e simples.
Hoje chorei. Algumas das minhas vaidades sucumbiram, algumas das minhas paixões morreram e o que eu sempre neguei, estou aceitando. O mundo está perdido.

t.s.eliot disse...

A poor poet imitates,
a good poet steals.

sábado, 10 de novembro de 2007

ana maria machado disse...

Não tenho pressa de publicar.
O importante é escrever.
Uma hora amadurece.
Posso estar enganada, mas
acho que tem muito mais
bobagem publicada do que
genialidade não-publicada.

Combatendo a solidão.

Ler. Ler é importante. Continue acompanhando, prometo falar sobre uma variável do tema que você ainda não conhece. Tá, eu sei que o seu professor fala disso toda aula e que os teus colegas te cobram. Até a sua mãe? Confesso que ela é esperta, até por que mães são ótimas referências de vida e geralmente entendem de tudo, de livros á dor de barriga – que espero não ser o seu caso.
Mas não quero repetir o jargão de que a leitura muda as pessoas ou talvez leitura é conhecimento. Todo mundo já sabe disso. Imagino que até o seu cachorro Rex – garoto esperto! Pretendo ir além. Acompanhei alguns encontros do Curitiba Literária, evento promovido pela Fundação Cultural de Curitiba, e um debate me chamou a atenção. Eric Nepomuceno – jornalista e escritor brasileiro, e David Toscana - escritor mexicano, falavam de leitura.
Em suma, quem lê pela primeira vez não entende a grandeza de um livro. Nele está expressa, muitas vezes de forma oculta, a personalidade do autor. A experiência de vida traduzida em arte. A grandeza de uma obra e o sucesso de um autor é isso, seduzir pela essência, humanização, pouco importando a fantasia. E o papel de um bom leitor é descobrir os indícios de uma história oculta dentro da história transcrita, que, geralmente, é muito mais interessante.
A palavra é protagonista diante do personagem. Que frase bonita, profética! A palavra estimula os sentidos. Aqui cabe uma observação feita por Toscana, que a experiência de ler é muito mais válida que a experiência de viver. E completa, entre risos, menos literatura erótica, apesar de que um conto bem escrito te faça ver estrelas muito melhor que o namorado. E esse prazer só é gerado através da leitura.
O livro também é memória coletiva. Tudo que é escrito, produzido vira material de pesquisa para futuros historiadores. Poderemos localizar informações precisas daqui uma década, ou duas, talvez daqui um século, sobre o que fizemos no dia oito de novembro de 2007, as 23h47. Mas do que descobrir que você escutava Tchaikovsky – não conhece? Existem ótimos livros para consulta! – o cara vai poder dizer seu sentimento diante da carga dramática expressa na música.
Impressionante nada. Para sentir a guerra não basta ver as fotos ou ler relatos. Os contos, os livros descrevem a sensação, e por isso a necessidade de ler. Ler é conhecimento! Sei que prometi não dizer, foi irresistível, acredite.
O cansaço toma conta dos seus olhos, pressinto. Finalizo, então: A leitura ocupa o espaço da solidão. Um bom livro pode ser seu melhor amigo, seu confidente, a tradução dos seus sentimentos. Cria identificação ou estranhamento, traz experiências parecidas pelas já vividas por você e que te fazem lembrar bons tempos. A imaginação e a criatividade afloram.
O relógio deve ser seu aliado. A falta de tempo é desculpa dos fracos. Seu filho precisa de atenção, mas como é gostoso poder colocá-lo para dormir escutando uma bela história e perpetuando a tradição, que de fato vem de casa, da leitura.

Entre o dread e o vermelho.

Fotos da brilhante Sabrina Magalhães.

Um quase cheiro de açafrão permeava aquela Ópera de Arame, as vinte e dezenove do dia quatro de novembro. Sobre o palco, a imagem de uma borboleta – traçada entre o azul e o vermelho – tomava conta de meio céu, disputado com esboços desfigurados de personagens futuristas reforçados por sua visão iluminada em tons entre branco e caramelo. O cenário, logo abaixo, era composto por instrumentos nada convencionais.
O gracejo dissonante da figura disforme toma vida e anda pelo palco em marcha marcada pela batida do bumbo, fazendo a platéia, que até então urrava em excitação, parar e permanecer, por um breve instante, em silêncio. Um tom de quase respeito solene, diante da criatura, abismou alguns e levou outros ao delírio. O espetáculo iniciava.
A fusão entre a diversidade da percussão resultava um rito afro, um canto indígena – uma mistura sem nome e com ritmo desconhecido. O Cordel do Fogo Encantado surge, então, entre o manto negro que ocupava a lateral do palco.
Cordel como sinônimo de história. Fogo como elemento representativo da existência de um povo, a intenção musical e poética dos seus personagens, marcado, principalmente, por sua inconstância. A visão profética entre o céu e a terra define o Encantado. Tudo isso da voz de Lira Paes, o vocalista.
A colorida mistura de expectadores lotou a frente do palco. O transe psicótico provocado pela música era o ritmo da dança de algumas mulheres com seus vestidos estampados e cabelos de dread. Um vai-e-vem lento contorcia as formas de uma ruiva baixinha. Entre elas, um grupo de rapazes pulava expressando deleite.
O fogo vivo toma forma no malabarismo teatral de Lira e evoca: Perto de você, Dentro da tua história, Eu carrego as paisagens, E as miragens do além, Digo que quebro as telhas,Da nossa grande construção, Pra durmir na amplidão. Os olhos ameaçadoramente abertos do cantor e a expressão corporal desenvolvida durante o canto de poesia são os elementos principais da mística apresentação. O espetáculo, como descrito pelo grupo.
O poeta popular representa o povo, dá voz a reclames, angústias e esperanças, tudo pela literatura de cordel. No início, pequenos poemas e historinhas compunham 40min de apresentação, com mais 10 de música. Com o tempo, o Cordel do Fogo Encantado musicou os versos antes recitados e compôs a cena de tragicomédia, apresentada pelo país em eventos de literatura, principalmente, como conta Emerson Calado, percussão e voz.

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome. A platéia declama, com furor, a pedido de Lira, alguns versos de Dos Três Mal-amados – Palavras de Joaquim, de João Cabral de Melo Neto. Os tons de voz fazem brilhar os olhos do vocalista, que comenta, depois, que esse é o objetivo do espetáculo. Levar a arte ao público de forma que o encante e o faça conhecer os grandes nomes da literatura brasileira. Pois o cordel é para ser ouvido e visto, sentido. Debulhar o trigo; Recolher cada bago do trigo; Forjar no trigo o milagre do pão; E se fartar de pão / Decepar a cana; Recolher a garapa da cana; Roubar da cana a doçura do mel; Se lambuzar de mel / Afagar a terra; Conhecer os desejos da terra; Cio da terra, a propícia estação; E fecundar o chão. Cantarola o público, algumas músicas depois, os versos de O Cio da Terra, de Milton Nascimento e Chico Buarque, afirmando o objetivo do grupo.

Luzes amarelas brandam a música e os ruídos da rua, verdadeira paixão de Lira, espalham-se pela multidão. A denúncia vem a tona. Religião – Os homens são anjos caídos que Deus mandou para Terra porque botaram defeito na criação do mundo. Aqui, começaram a inventar coisas, a imitar Deus. E Deus ficou zangado, mandou muita chuva e muito fogo, eu vi de perto a sua raiva sacra, pois foram sete dias de trabalho intenso, a ignorância e acomodação do povo – Sou palhaço do circo sem futuro; Um sorriso pintado a noite inteira; O cinema do fogo; Numa tarde embalada de poeira, a política – A matadeira vem chegando; no alto da favela; no balanço da justiça; do seu criador / Salitre, pólvora, enxofre, chumbo / O banquete da terra; Teatro do Céu; O banquete da terra; Teatro do Céu / Diz aí quem vem lá, O velho soldado; O que trás no seu peito?; A vida e a morte / E o que trás na cabeça?; A matadeira; E o que veio falar?; Fogo.

Mistério. A formação teatral de Lira cria o clima intimista. Seus gestos completam a música e convidam o público para o novo. A direita jovens jogam capoeira e a esquerda um homem de trinta e poucos anos faz gestos de percussão, talvez inspirado por Emerson Calado e sua influência New Metal. O ritmo toma tom com a literatura, o rezado, o toré, o blues de Robert Johnson, o samba de coco, o rito afro e a mística indígena, completa Nego Henrique, percussionista.
Foram embora. E voltaram, entre reverências da platéia, que gritava em sinal de adoração. Cumpriram um, entre os oito show programados para o mês.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Gaby!

Oi para você!
Eu sou a Gaby, a princesinha linda da dinda!
Nasci hoje, 24 de outubro, 9:32 da manhã.
Peso 2,700Kg e tenho 49cm.
Um beijinho para todos!

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

A sombra.

Um continho de assombração - não me julgue, sei que parece um drama, mas na falta de qualquer outra coisa para escrever, foi isso mesmo... Detalhe: escrevi para minha aula de redação. :$

A casa não era tão antiga. Foi construída há uns quatro anos, quando o bebê nasceu. Era bonita até, de madeira reforçada, pintada de amarelo vivo que contrastava com as grossas portas marrons. A entrada dava para uma sala ampla com grandes janelas, onde agora se via apenas um velho sofá e uma mesinha, outrora suporte da televisão. Um pouco além, exatamente no meio da casa, era a cozinha. Duas bonitas cadeiras de madeira, empoeiradas pela ação do tempo, jaziam no ambiente, e nas paredes ainda permanecia a marca da disposição dos antigos móveis e utensílios. Todo o resto fora levado dali.
O primeiro quarto era do casal e, por sinal, foi o único que se mantivera intacto. A bela cama estilo Luis XV repousava ao lado da porta com os pés voltados para a janela e ocupava duas paredes, tomando conta de quase todo o espaço, sobrando apenas uma parede lateral para o guarda-roupa vazio e o antigo aquecedor a gás. Os outros dois quartos eram banhados apenas com a penumbra do anoitecer e revelavam as sombras das árvores do quintal.
Fazia tempo que ele não entrava na casa. Desde o dia que ela tinha carregado tudo e ido embora com o seu pequeno bebê, há um ano. A imagem daquele lugar, que um dia fora um lar feliz, chegava a lhe dar arrepios. As teias de aranha e o pó eram os novos habitantes e não pareciam dispostos a sair.
E, por pior que fosse a situação, ele sabia que teria que ficar ali, já não tinha para onde ir. O ano que passou na casa de reabilitação tinha sido lento e doloroso, e agora, curado, deveria seguir em frente.
Receoso deu um passo na sala, tentando adaptar-se à nova situação, e um rangido fino e dengoso tomou conta do ambiente. Tinha até esquecido como fazia barulho aquele chão de tacos. Criou-se uma sinfonia em cada passo dado. Olhou para fora a procura de algum passante, mas tudo que viu foi o balanço, cada vem mais intenso, das árvores. Aquele final de tarde de julho era o típico dia de inverno. O vento tomava cada vez mais velocidade, fazendo com que as árvores emitissem um murmúrio longo, quase uma canção selvagem.
Preparou-se para dormir. Lavou o rosto no pequeno banheiro que ficava entre o seu quarto e o antigo quarto do bebê. Seria o tamanho do banheiro, motivo de briga constante, que teria feito com que ela fosse embora? Agora os lamentos já não adiantavam. Ligou o aquecedor, que por sorte ainda funcionava e rapidamente esquentou o ambiente. Deitou-se na cama, no seu lado direito de sempre. Com uma mão puxou a porta e a fechou completamente. Apagou a luz e procurou esquecer o que o ano que passou não conseguiu. Precisava, pelo menos naquela noite, dormir em paz.
Adormeceu. Os sonhos começaram a rondar sua mente. Seu menininho foi o primeiro que tomou forma. Os primeiros passinhos, a risadinha gostosa que fazia cada vez que ia tomar banho. Um delicioso filme em câmera lenta. Ele havia decidido não tomar mais o remédio, precisava sonhar. E aquele sonho era muito bom. Sua esposa sorrindo, marcando as bochechas sardentas daquele rosto tão delicado.
O coração dispara. A imagem daquela sala vazia, depois de um longo dia de trabalho, volta a sua mente. O desespero toma conta de sua alma e o ritmo incessante da chuva que jorra lá fora o conduz para a busca desenfreada de uma explicação. Ela saiu sem deixar rastros e ele foi atrás. E o encontro foi trágico. A cena do caminhão tombado repercutiu sua mente e o barulho do vento em contato com as paredes de madeira ficava cada vez mais forte. Os galhos das árvores batiam com violência na janela, coberta com uma fina cortina branca. Eles haviam morrido naquela noite, um ano atrás. Ela jamais deveria ter saído daquela forma de casa e levado seu pequeno tesouro junto.
O som da batida do caminhão misturou-se ao angustiante som da chuva. Apavorado, acordou molhado com o suor que saía de cada parte de seu corpo. Estava encharcado, como se estivesse estado na chuva. Olhou o reflexo produzido pelos raios através da cortina e teve medo. Fechou os olhos, na expectativa de que aquilo fosse um sonho. Lentamente os abriu e como sorte tudo se acalmou. Os últimos pingos de chuva foram ficando serenos e ele tentou adormecer novamente. Somente o barulho de madeira ficou no ar.
Então um frio estranho, penetrante, invadiu o quarto e fez com que ele tivesse calafrios. Era inexplicável aquela sensação já que o aquecedor estava ligado no ponto mais alto. Levantou, verificou que o aparelho funcionava normalmente e tornou a deitar. Mas aquela sensação depressiva e angustiante continuava. Não havia ninguém ali que pudesse ajudá-lo. Ouviu então, passos. Um alívio tomou conta do seu ser. Era reconfortante ter alguém por perto. Mas quem estaria rondando a casa na calada da noite? Tremendo de frio fez um esforço e foi abrir a janela. Não viu ninguém. Estaria ficando louco? Recolheu-se no meio das cobertas, quase em posição fetal. Silêncio outra vez. Seus sentidos já não correspondiam à realidade. Uma forte batida na porta da frente lhe fez tremer. Estavam tentando lhe pregar uma peça, sabia disso. Tentou relaxar e não parecer impressionado. Mas o medo, ah o medo. Ratos, uma casa há tanto fechada deveria ter ninhadas deles. Passos. O barulho de salto alto em contato com o chão caminhando lentamente em direção ao quarto o surpreendeu em meio a seus devaneios e deixou sua respiração ofegante. Sabia que havia trancado bem as portas. Recolheu-se novamente e cerrou firmemente os olhos. Que peças mais o destino havia de lhe pregar? Um suave rangido penetrou em seus ouvidos. Era a porta do quarto abrindo vagarosamente. Sentiu um suspiro frio no pescoço e gelou. Escutava, vindo do quarto ao lado, o choro intermitente de uma criança. Soava como melodia. Ela estava de volta, enfim, agora sim poderia descansar.

domingo, 21 de outubro de 2007

Sinto vergonha de mim!

Sinto vergonha de mim por ter sido
educador de parte desse povo,
por ter batalhado sempre pela justiça,
por compactuar com a honestidade,
por primar pela verdade e por ver
este povo já chamado varonil
enveredar pelo caminho da desonra.

Sinto vergonha de mim por
ter feito parte de uma era
que lutou pela democracia,
pela liberdade de ser
e ter que entregar aos meus filhos,
simples e abominavelmente,
a derrota das virtudes pelos vícios,
a ausência da sensatez no
julgamento da verdade,
a negligência com a família,
célula-mater da sociedade,
a demasiada preocupação
com o "eu" feliz a qualquer custo,
buscando a tal "felicidade" em caminhos
eivados de desrespeito para com o seu próximo.

Tenho vergonha de mim pela
passividade em ouvir,
sem despejar meu verbo,
a tantas desculpas ditadas
pelo orgulho e vaidade,
a tanta falta de humildade
para reconhecer um erro cometido,
a tantos "floreios" para justificar atos criminosos,
a tanta relutância em esquecer a antiga posição
de sempre "contestar",
voltar atrás e mudar o futuro.

Tenho vergonha de mim pois faço
parte de um povo que não reconheço,
enveredando por caminhos
que não quero percorrer...

Tenho vergonha da minha impotência,
da minha falta de garra,
das minhas desilusões e do meu cansaço.
Não tenho para onde ir
pois amo este meu chão,
vibro ao ouvir meu Hino
e jamais usei a minha Bandeira
para enxugar o meu suor
ou enrolar meu corpo
na pecaminosa manifestação de nacionalidade.

Ao lado da vergonha de mim,
tenho tanta pena de ti,
povo brasileiro!

"De tanto ver triunfar as nulidades,
de tanto ver prosperar a desonra,
de tanto ver crescer a injustiça,
de tanto ver agigantarem- se os poderes
nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude,
A rir-se da honra,
a ter vergonha de ser honesto"
Rui Barbosa
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Odeio tevê. Não assisto, não gosto. Que publicitária! Sempre fui meio pé atrás de comentar isso com as pessoas, elas se assustam geralmente. O que eu faço quando não estou trabalhando? Ver tevê é quase uma obrigação. Isso e saber quem matou a Taís. Quem matou?
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Devido ao mal tempo, os Jogos da UniBrasil – comento na próxima, merece – foram cancelados e voltei mais cedo para casa. O aparelho estava ligado na sala e, cansada, fui assistir um pouquinho de qualquer coisa que passasse. Canal 11 da tevê a cabo, Show do Tom. O personagem João Canabrava estava distribuindo R$50,00 para o ‘felizardo’ que cantasse, pelo menos, um trecho do Hino Nacional Brasileiro. Um conseguiu. Fiquei satisfeita, apesar do resultado. Aprendi variações jamais imaginadas!
“Ouviram no Ipiranga mangas plásticas”
“Ouviram do Ipiranga as margens flácidas”
“De um povo herói com o prado relutante”
“E o sol da liberdade, em raios fungos”
Sim, também pensei em um concurso cultural para uma nova letra. O novo Hino teria apenas uma estrofe, mas, vejam, todos cantariam. Que glória. Aleluia irmãos!
O grande Rui Barbosa, aqui, me é ilustração. E reflexão, com seu texto datado do início do século XX.
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Perdoe-me, ó Pai, mas, alguém ai me empresta um livro?

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Dói.

Mamãe brigou comigo. De novo. Não posso falar mal de ninguém, que saco! O motivo: ofende as pessoas. Ela leu minha declaração de amor, logo ai embaixo. Nas suas palavras, tem muita gente que gosta e eles são um exemplo de perseverança para o Brasil. A música atinge as diversas classes sociais e as pessoas esquecem os problemas. Sempre tem uma desculpa! Boa menina que sou (essa copiei de um professor), só contesto com argumentos.
Entrei no site do Zezé Di Camargo e Luciano, o oficial. Uma graça. Conta a história da dupla, mantém um calendário atualizado de shows, tem espaço para o fã-clube, cifras – iniciei as aulas de violão! – e explica o motivo de tanto sucesso. Concordo com a Dona Zê, eles são um exemplo de perseverança. E só.
Perdi a inocência. Sempre acreditei que minha mãe tinha razão sobre tudo. Foi um susto. Juro: ficaria feliz de escrever sobre os diversos projetos sociais da dupla. Comentar as fotos com criancinhas e aquela balela toda. Nada. Mas se você quiser comprar um CD ou DVD, o link da Americanas ocupa ¼ de página.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Meio nua, meio tampada.

Esporte deve ser assim: confraternização de amigos. Joga quem quer, e por diversão. Nada de meias-palavras, muito menos meio-vocabulário. Estudiosos, batalhadores. Abra a boca para profissionalização. Cartão vermelho!
Tenho uma bronca tremenda com ‘peixe’ que aprende a fazer embaixadinha e vira astro. Cem mil por mês é só a despesa da casa. Aliás, que casa! Claro, fico aguardando a empresa que o tal vai abrir. Gerar empregos, para quê? Coisa boa é tevê, cerveja gelada e ver ‘os cara jogar’. Hum, amendoim torrado.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

É a sua indiferença...

Comecei a gostar de Zezé Di Camargo e Luciano. Gostar não, admirar. Explico. Sábado ensolarado e aquela fome, estava sem almoço e uma hora daquela nem valia a pena fazer comida. A salvação era a panificadora, lógico. Empolgada pedi o de sempre: x-egg sem hambúrguer e sem presunto, com queijo extra. A maionese dessa panificadora é o toque especial, fica delicioso.
Então, sentada aguardando, veio aquela vontade de conversar. A atendente estava descartada, coitada, mal piscava tentando não esquecer o que não podia colocar no sanduíche – é difícil, de verdade.

Foi quando escutei uma música (ou um ruído?) e logo reconheci, era a dupla. Mas essa melodia, essa letra, sem palavras! Fui tocada profundamente. O nome da música é “Indiferença” - fiquei sabendo por intermédio da atendente, entre duas fatias de tomate e uma folha de alface. Transcrevo aqui um trecho de profunda genialidade:
É a sua indiferença que me mata. É uma invasão, um nó dentro de mim. Coração divide em dois na sua falta. Uma parte é o começo a outra o fim”.
Impressionante. Que descoberta! Uma parte é o começo a outra o fim. Nem mesmo os mais profundos estudiosos poderiam suspeitar que de um lado é o começo e no outro o fim. Nossa.
E são essas letras que movimentam nossa Indústria Cultural. Tom, Chico e Caetano são acasos da natureza quando uma obra dessas é apresentada. Vinicius, coitado, vira um ‘sonhador’ diante de tanta riqueza sonora. Bom senso?

O sanduíche estava muito gostoso, mas veio com presunto. Deve ter sido a lembrança do ex, embalada pela doce canção, que fez a pobre Rosangela esquecer esse detalhe.